segunda-feira, 5 de março de 2018

Correio do Ceará - 1915, Um Marco no Jornalismo Cearense


 
Rua Conde D'Eu. Primeira sede
Os grandes jornais do País se postaram como mensageiros das tragédias no Ceará. Nos séculos XIX e XX o 
Estado passou imagem negativa, uma terra enraizada nos problemas climáticos e políticos. Caricaturistas do Rio de Janeiro e de São Paulo traçavam o líder oligárquico Nogueira Accioly ao fenômeno da seca que porventura inquietasse o Sudeste: “ O comendador trouxe a seca do Ceará”. Essas informações chegam às redações através do seus representantes, que eram muitos, de Fortaleza, com seus informativos apreciados e disputados pelos leitores sedentos por notícias. Uma devoção que começou oficialmente  pelas mãos de um padre em meio a um clima político tenso e por uma concorrência de grupos partidários.





 
Primeiro número do Correio
O historiador Perdigão de Oliveira propôs que a imprensa cearense surgiu em 1817. O presidente da Província, Manoel Inácio de Sampaio, teria criado uma gazeta, fazendo-a circular por todo Ceará, informando sobre a Confederação do Equador, na verdade uma revolução. Isso lhe custou uma discussão com Barão de Studart, que manteve o jornal Diário do Governo do Ceará como o introdutor do jornalismo no Ceará. Seu redator era Gonçalo Inácio de Loiola de Albuquerque e Melo, o Padre Mororó, passando a operar a partir de 1 de abril de 1822 pelas máquinas  dos tipógrafos Felipe Lana e Urbano Paz. O destemido religioso, que foi um dos mártires fuzilados no Passeio Público por se posicionar contra o autoritarismo de D. Pedro I, é um ícone da imprensa cearense.




Passados alguns anos surgiram os famosos jornais com potencialidades comerciais, numa fase do jornalismo de cunho partidário, de críticas aos adversários e fofocas. Por um lado os conservadores, Pedro II (1840 - 1889) e Constituição (1863 - 1889), e do outro os liberais, O Cearense (que tornou-se Cearense, 1848 - 1891), este, conforme João Brígido (do Unitário, de 1908), introdutor no jornalismo científico no Ceará. Resumindo, uma imprensa atrelada a ataques que, em suma, visavam a conquista da presidência da Província, ou seja o poder.



 
A. C. Mendes
 
Contudo, foi com o surgimento do Correio do Ceará que finalmente Fortaleza pode apreciar um jornal fiel aos princípios do jornalismo, com noticiários e publicidade. Criado em 2 de março de 1915, era um órgão ligado à Diocese de Fortaleza, mas independente. Seu fundador, Álvaro da Cunha Mendes (A. C. Mendes, do Diário do Estado, 1914), instruiu-se em São Paulo, na perspectiva de inovar a maneira de levar as informações do dia a dia aos seus conterrâneos. Excêntrico, o fundador vestia-se finamente, embora gostasse do branco, a cor dos sapatos, meias, de tudo, inclusive da sua pele. E na questão higiênica cobrava de toda a equipe o devido asseio, muitas vezes em tom de deboche: "Aqui não é sujo como jornal do Rio!".

 Eram redatores padres como Silvano de Sousa, e dirigida pelo Padre Climério Chaves.  Com a criação do O Nordeste (1922,) por Monsenhor Tabosa para a Diocese, o Correio do Ceará tornou-se mais imparcial e fiel ao jornalismo. Já as receitas não partiam da exclusividade das vendas dos jornais, pois o dono possuía rendas dos Estabelecimentos Gráficos A. C. Mendes.







Cônego Climério Chaves





1960. Jornal na rua Senador Pompeu
Nos anos 1920, Fortaleza contava com alguns jornais combativos como Correio do Ceará, O Ceará (de J. Matos Ibiapina), O Nordeste (dirigido por Andrade Furtado), Gazeta de Notícias (de Antônio Drummond) e O Povo (de Demócrito Rocha). Dentro dessa linha, A. C. Mendes fez várias denúncias, mas uma delas tornou-se foco de atenção dos cearenses, digno de debates acalorados. Após publicar relatos sobre desvios de verbas da Inspetoria Federal de Obras Contra Secas (IFOCS), envolvendo personalidades como Pompeu Sobrinho, acabou preso no dia 27 de julho de 1926, durante o governo de Artur Bernardes. O STF o impôs uma pena de seis meses, das quais a metade foi cumprida, mais pagamento de multa de dois mil réis, em vista às apelações jurídicas e populares. Parecia que toda a cidade o acompanhou desde a sede do jornal, na Rua Conde D’Eu, 183, ao então quartel do 23° BC, na Av. Alberto Nepomuceno. A multidão lembrava a inauguração da estatua de D. Pedro II, em 1913, quando todo o largo da Sé foi tomado por curiosos.



 
1926. Prisão de A. C. Mendes (Arquivo Nirez. Gentileza Fortaleza Nobre)


 No estilo austero, era o mais popular, fruto de um trabalho empresarial definido, da redação à oficina com código de disciplina e política salarial, respeitando a ordem previdencial e consequentemente os direitos e deveres dos empregados. E para tal, Álvaro Mendes e H. Firmeza muitas vezes faziam concursos para atrair bons profissionais



 
Primeira edição pelos
Diários, em 1937

O Correio do Ceará acabou vendido aos Diários Associados, de Assis Chateaubriand, em 1937, logo após a criação de um concorrente, O Estado, de José Martins Rodrigues. Muita expectativa por se tratar de um ano eleitoral, marcado pelo Estado Novo, que culminou com um regime ditatorial a partir de novembro. Nem por isso a redação do jornal se recolheu. Com a direção de João Calmon e circulando de segunda à sexta-feira à tarde (às 15 horas em ponto) e sábado pela manhã, manteve as suas editorias independentes, com grandes colunistas, valorização do esporte e da cultura cearense. Durante o Estado Novo, nos anos 40, combateu o regime autoritário, porém, durante a ditadura de 1964, sob direção de Eduardo Campos, apoiou o regime militar.






 
 
H. Firmeza, "Príncipe dos Jornalistas
do Ceará". Revisava todo o jornal
Os Diários Associados passavam a contar com três jornais: Correio do Ceará, Unitário e Gazeta de Notícias, sucessos em retorno financeiro, numa época de paixão pela leitura e pela comunicação. Então vieram a aquisição da Ceará Rádio Clube, e, em 1960, a revolucionária TV Ceará, Canal 2. Destaques da imprensa, que militaram naquele jornal, Hermenegildo Firmeza (H. Firmeza), João Calmon, Eduardo Campos, Antônio Moreira de Albuquerque, Antônio Carlos Campos de Oliveira, Blanchard Girão, Fernando Sátiro, Felizardo Montalverne, Geraldo Oliveira (fotógrafo), Vieira Queiroz (fotógrafo), J. Ciro Saraiva, Teixeira Cruz, Boaneges Facó, Antonio Soares e Silva, Raimundo Guilherme, Nery Camello, Luiz Bezerra, Hildebrando Espínola, Colombo Sá, Pádua Campos, Teobaldo Landim, Luciano Diógenes, Milano Lopes, Juarez Timóteo, Roberto Vasconcelos, Adauto Gondim, José Olívio (gráfico), Francisco Soares de Medeiros, Severino Palácio e Geraldo Nobre, este um dos maiores amantes do jornal. Contava que, ainda jovem, aguardava o vizinho ler o Correio para pedir emprestado, às segundas feiras, quando o mesmo 

saía com o resumo da semana anterior.









 Em 1965, em comemoração ao seu centenário, saiu com quatro edições especiais, sendo que a Associação Cearense de Imprensa promoveu o Curso Livre de Jornalismo. Em 1980 o jornal passaria a Venelouis Xavier Pereira, tendo Colombo Sá seu editor. Não duraria mais que dois anos, porém com magistral número de 19.962 edições.



1960. Jornal se antecipa ao rompimento de parede do Orós


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                                                                                            Fotos e consulta: Correio do Ceará