A Monarquia x Igreja
A partir da década de
1870, a Igreja Católica e o Exército tiveram sérios atritos com o governo
imperial. Em 1874, a crise entre a Igreja Católica e a monarquia tornou-se
grave. Foi quando o imperador D. Pedro II mandou prender bispos de Olinda e
Belém, condenados a quatro anos de trabalhos forçados por terem proibido os
católicos de suas dioceses de participar de atividades da Maçonaria. A atitude
revoltou a direção da Igreja, que protestou energicamente contra a medida
autoritária do imperador.
Por outro lado, parte
da oficialidade do Exército começou a se afastar da monarquia após a Guerra do
Paraguai (1865 - 1870). Durante a mesma, muitos oficiais viajaram para países
de regime republicano e voltaram criticando a monarquia, principalmente a
corrupção, que, segundo eles, era praticada pelos políticos corruptos “aproveitando-se
da miséria do país”. Em 1884, o governo proibiu os oficiais de se manifestarem
via imprensa sem autorização do Ministro da Guerra.
A Queda da Monarquia
Adoentado, o
Imperador D. Pedro II afastava-se cada vez mais das crises e decisões do governo.
Com as ideias republicanas espalhando-se pelo Brasil, cafeicultores paulistas,
operários e a classe média, influenciada por setores privados industriais
ingleses, procuravam mais espaço político e os desentendimentos cada vez maios
proeminentes pressionavam a monarquia. Republicanos militares, como Benjamin
Constant e Quintino Bocaiúva, procuravam o apoio do então monarquista e amigo
do imperador, marechal Deodoro da Fonseca, fundador e presidente do Clube
Militar, que sempre defendera os militares perseguidos e de confiança
sobre tropa. Ele que viria a demitir, em
15 de novembro de 1889, o Conselho de Ministros, assumindo o seu comando e
assinando, naquela noite, o manifesto de proclamação da República. Na madrugada
seguinte, 16, D. Pedro II recebeu a comunicação da mudança de regime e a
intimação para deixar o Brasil em 24 horas. Na noite de 17 para dezoito de novembro a família imperial partiu para a Europa. Iniciava-se
o período republicano.
A Influência do Imperialismo
A independência dos países da
América Latina, no início do século XIX, não alterou o processo do
antigo “pacto colonial”, no qual a economia das colônias complementava à das
metrópoles, ou seja, cultivava matérias primas e destinava seus metais
preciosos para o mercado europeu. Os novos países não romperam com as
estruturas sociais e econômicas construídas durante o período colonial.
A grande propriedade,
latifúndio, manteve-se com base na monocultura tropical para exportação,
persistindo, no caso do Brasil, a mão de obra escrava e o poder nas mãos da
aristocracia rural e dos grandes comerciantes. Uma sociedade fechada e voltada
às modas e costumes do Velho Continente. Isso impossibilitou o desenvolvimento
econômico-social como nos Estados Unidos, igualmente independentes. Nesse sentido,
com a riqueza concentrada numa minoria, recorreu-se ao capital estrangeiro.
Foi o caminho
trilhado pelas elites educadas na tradição conservadora da Península Ibérica,
acomodadas às enormes desigualdades sociais e habituadas a consumir produtos de
origem europeia. Para ela, seria cômodo e interessante ceder à dominação
econômica dos países capitalistas industrializados, principalmente da
Inglaterra, que fornecia artigos modernos e de qualidade em troca de produtos
primários.
Esses empréstimos se
davam por duas vias. Uma pelo capital publico, dos governos; e privado, oriundo
de bancos particulares. A outra eram investimentos diretos de capital,
principalmente em mineração, operações financeiras, comércio de exportação e
importação, transportes (ferroviários e companhias de navegação) e serviços
públicos urbanos, como a iluminação a gás e linhas de bonde. Nesse caso, as
empresas estrangeiras investiram, instaram-se e administraram os negócios no
Brasil, levando praticamente todas as
receitas.
Os países da América
Latina, embora independentes, passaram a manter com as nações industrializadas
uma relação de independência econômica. Entretanto, seus governos não poderiam
manter esse tipo de relação sem a aprovação das elites dominantes.
República dos Marechais
A proclamação da
República no Brasil partiu de um movimento de cúpula controlada, em primeiro
momento, pelos militares e pelas elites agrárias. Não se preocupou em trabalhar por mudanças
estruturais e econômicas. Tratou-se da mudança de um Estado unitário imperial
pelo Estado federativo. O setor agrário, a grande propriedade rural, ainda
voltado à exportação, conservou a política bem longe da reforma agrária,
sustentada no coronelismo do interior e oligarquias agrárias. A implantação da
República não foi fruto de um processo revolucionário em que os grupos
populares tenham participado ativamente, nem ampliou a representação política
no país, uma espécie de realinhamento entre os grupos dominantes, continuou
sendo exclusão social, política e econômica de grande parte da população.
O Golpe Militar
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Deodoro e seu ministérios |
Os líderes do
movimento republicano escolheram provisoriamente, enquanto aguardava a nova
constituição, o marechal Deodoro da Fonseca, um antigo monarquista, líder do
Exército, ex-combatente da Guerra do Paraguai e amigo de D. Pedro II, o novo
chefe do governo. Ele compôs o ministério com civis e militares engajados nas
mudanças, como Quintino Bocaiúva (relações Exteriores), Campos Sales,
representante dos cafeeiros paulistas (Justiça), Benjamin Constant (Guerra) e o
famoso jurista Rui Barbosa para o Ministério da Fazenda. O País passava a ser
uma República Federativa com o nome de Estados Unidos do Brasil, sendo as
províncias transformadas em estados, adotando, uma nova bandeira com o lema “Ordem
e Progresso” e a convocação de uma Assembleia Constituinte.
Constituição de 1891
Convocada nos
primeiros dias do governo republicano, a Assembleia Constituinte só deu início
a seus trabalhos em novembro de 1890. Apenas três meses foram suficientes para
a sua conclusão, entrando em vigor em 24 de fevereiro de 1891. Baseada na Carta
norte-americana, e revisada por Rui Barbosa, dava maior autonomia aos estados.
Ela elegeu oficialmente o marechal Deodoro da Fonseca presidente da República,
derrotando o representante da oligarquia cafeeira paulista, Prudente de Morais.
O vice-presidente eleito o militar Floriano Peixoto. A seguir, transformou-se
em Congresso Nacional constituído em Senado e Câmara dos Deputados. Até a
reforma eleitoral de 1881, na Monarquia, as eleições eram indiretas e
censitárias, mas a nova Constituição baixou de 25 para 21 anos a idade com
direito a voto direto sem exigência de renda, voto masculino dos alfabetizados
que representavam apenas 2% da população.
Rui Barbosa e a
Economia
A abolição da
escravidão e a migração europeia criaram um número maior de assalariados. Isso
carecia de maior injeção econômica. Somados ao comércio interno engatinhando,
chegava o momento da ousadia. No comando da equipe financeira, a principal
preocupação de Rui Barbosa foi transformar o Brasil numa república capitalista,
promover uma profunda mudança na economia, atentando para o crescimento da industrialização,
o que só seria possível, na sua avaliação, se houvesse recursos para investir
na produção. Afinal, com a Europa duvidando do sucesso do novo regime, o Brasil
não conseguiu empréstimos estrangeiros. Entretanto, praticamente sem dinheiro
para investimento, a saída foi criar linhas de credito e aumentar o volume de
papel-moeda em circulação.
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Caricatura de Rui Barbosa anunciando o desenvolvimento |
Em janeiro de 1890,
iniciou-se uma política financeira que permitia quatro bancos, situados no Rio
de Janeiro, Salvador e Porto Alegre, emitirem dinheiro praticamente sem
controle governamental. Houve forte incremento de volume de negócios no país,
sendo fundadas, somente naquele ano, 313 empresas, muitas delas “fantasmas”,
com o objetivo de tomar dinheiro emprestado. A maioria tinha como meta a venda
de ações para obtenção de lucros fáceis no mercado financeiro. Nos dois
primeiros anos o aumento da quantidade de dinheiro em circulação foi espantoso,
provocando onda especulativa na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro.
Encilhamento e a
Crise
A febre por
“investimentos” financeiros recebeu o nome de “encilhamento”, devido à
semelhança que existia entre a barulheira feita na hora fechamento dos negócios
na bolsa de valores, lembrando as jogatinas das corridas de cavalo e à agitação
durante o fechamento das apostas na hora em que se colocavam cilhas (arreios)
nos animais.
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Caricatura do "encilhamento" |
A produção interna,
porém, não cresceu. Procurando o alinhamento, Rui Barbosa tomou medidas que
aumentaram tarifas alfandegárias, protegendo a produção industrial sobre
produtos estrangeiros que tivessem produtos similares no Brasil. Mas
prejudicava a burguesia agrária latifundiária exportadora e os investimentos
internacionais. Avaliou mal a importância daquele setor, que representava ¾ das
exportações brasileiras. São Paulo, cujos bancos, ligados aos cafeeiros,
boicotara o plano econômico, aumentou a pressão por ajustes. Queria apoio para
participar também do processo de industrialização, o que não aconteceu.
Em 1891 ocorreu
acentuada queda nos preços das ações, o princípio de um desastre. Com a alta
dos preços dos produtos cresceu a inflação, de 1,1 % em 1889 para 89,9 % em
1891, não demorando muito para que uma série de crises financeiras abalasse o
país. A euforia deu lugar a sequencias de falências de empresas e de
estabelecimentos bancários. Fortunas foram levantadas e destruídas nesse
pequeno intervalo de tempo.
Assim, vendo seus
interesses em risco pela nova política econômica, bancos ingleses e franceses
ameaçaram abandonar o País. O ministro, estudioso em legislação, reagiu citando
a obrigatoriedade de seguirem os estatutos aprovados, obrigando-se às leis e
regulamentos vigentes. E dessa forma os segurou, no entanto sem forças para
superar o discurso pessimista e ameaçador da oposição.
Tanto os fazendeiros, sempre de olho no poder, como as
empresas estrangeiras, contra a industrialização rápida e para continuar
exportando para o Brasil, começaram a forçar o afastamento do ministro Rui
Barbosa, sendo claro o aviso ao presidente. Pressionado, Deodoro demitiu o
ministro da Fazenda, colocando em seu lugar um monarquista conservador, o Barão
de Lucena, que defendia o predomínio agrícola. Desse modo, o outro lado,
industrialista, reclamou. Os dois lados reivindicando e a crise cada vez mais
presente.
A Queda de Deodoro
Deodoro da Fonseca,
visto como autoritário, enfrentou forte oposição desde o início do seu governo.
Em agosto de 1891, os parlamentares tentaram aprovar uma lei limitando os
poderes do presidente. Em resposta, ele fechou o Congresso e decretou estado de
sítio, com novas eleições parlamentares, ferindo a Constituição Federal e
desencadeando uma rebelião interna liderada pelo almirante Custódio de Melo.
Com os navios de guerra apontando seus canhões para a cidade do Rio de Janeiro,
os revoltosos exigiram a renúncia do presidente. Sem apoio para reagir, Deodoro
da Fonseca deixou o cargo em 23 de novembro daquele ano. O seu vice, Floriano
Peixoto, também remanescente da Guerra do Paraguai, assumiria o governo em meio
ao primeiro golpe da República iniciada a partir de outro golpe. Mais um
representante militar no novo regime sem conhecimento da sua doutrina.
O Ceará na República de
Deodoro
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Estátua de D. Pedro II
na Praça Caio Prado (Sé).
Fortaleza CE
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Com a proclamação da República, cada província do antigo império
passou a constituir um Estado, com mais autonomia para resolver os seus
problemas e fazer as suas leis, respeitando a Constituição Federal. O Ceará não
estava preparado para a repentina mudança. Sem bolsa de valores, eram poucos os
que se aventuravam em ações, preferindo, quando muito, investir na metrópole,
Rio de Janeiro, capital. Com a economia sustentada pelo comércio, em plena
efervescência do algodão e prosperidade das casas de vendas de tecidos e de
produtos importados de luxo, a detentora do poder, a elite, estava satisfeita
com seu nível de vida, aliada da Monarquia.
Embora existisse em
Fortaleza a União Republicana e o Centro Republicano, fundado em 9 de junho de
1889 por expoentes da literatura como Papi Junior, João Cordeiro e Antônio
Sales, os civis praticamente não se manifestaram. Grupos isolados saíram às
ruas de Fortaleza em protesto contra D. Pedro II. Placas que lembravam o antigo
regime foram arrancadas e substituídas por nomes ligados à causa republicana.
Dirigiram-se ao Palácio da Luz, sede do governo, proclamando o cidadão Luiz
Antônio Ferraz (Coronel Ferraz), governador do Estado Livre.
Coronel Ferraz
dissolveu o poder legislativo municipal e criou o Conselho de Intendência
Municipal. O novo processo de sistema de representatividade democrática, agora
sem os tradicionais partidos, Conservador e Liberal (este dominante, embora
dividido, no final da província), entretanto, não surtiram avanços. Continuou
dentro dos padrões antigos, mantendo o eleitorado fidelidade ao chefe
distrital, o “voto de cabresto”.
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Clarindo de Queiroz, governador do Ceará |
Após a morte
prematura de Coronel Ferraz em 10 de fevereiro de 1891, assumiu interinamente o
governo estadual o major Benjamim Liberato Barroso, sendo logo substituído pelo
titular, o general José Clarindo de Queiroz, em 28 de abril de 1891, enquanto o
outro seu vice. “Herói” da Guerra do Paraguai e ex-presidente da Província do
Amazonas (1879), o novo dirigente não teve paz. Enfrentou um período
turbulento, instável, de forte oposição à sua administração.
O então deputado
Nogueira Accioly, presidente da Assembleia Legislativa, fundador da União
Republicana (1890) e sogro do líder liberal, o falecido Senador Pompeu, estaria
por trás de uma série de manifestações que tinham como objetivo a queda do
governador a partir de dúvidas quanto à lisura do pleito congressual dos
governos federal e local.
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Gal. Freire Fontenelle, ainda coronel, em 1880 |
Acusava-se Clarindo
de Queiroz de influir nos resultados eleitorais. Em seguida veio o
desentendimento entre os policiais do Estado e alunos da Escola Militar de
Fortaleza, um conflito que cresceu em poucos dias, tornando-se insustável o
diálogo. O governador não concordava com as exigências dos alunos, que pediam
demissões na esfera administrativa. Em meio às prisões de manifestantes e clima
de tensão na cidade, com muitos moradores abandonando suas casas temendo uma batalha
desastrosa, veio a queda do presidente da República, entrando em cena o tenente-coronel
José Freire Bezerril Fontenelle, que fora deputado constituinte.
Bezerril Fontenele,
comandante da Escola Militar, tendo em vista a falta de apoio do novo presidente
Floriano Peixoto ao comandante cearense, procurou convencer Clarindo de Queiroz
a renúncia, o que não aconteceu formalmente. O governador do Ceará sequer
atendeu a solicitação de Floriano para que fosse ao Rio de Janeiro para tratar
de “assuntos militares”, só cumprindo o chamado legalmente, caso o legislativo
autorizasse.
No dia 16 de
fevereiro de 1892, os alunos da Escola Militar, apoiados por tropas navais e de
infantaria, incentivados por seus oficiais, cercaram o Palácio da Luz. À tarde,
veio o tiroteio, destruindo a praça do largo, mas sem maiores danos ao
histórico prédio. A estátua do General Tibúrcio, porém, foi ao chão, e segundo
relatos tombou de pé. Pela manhã, contando apenas com a lealdade do conselheiro
Rodrigues Junior, o governante se rendeu, partindo para o Rio de Janeiro, onde
morreu pouco depois de prisão e tortura.
Assumiriam o governo
do Ceará, após a interinidade de Liberato Barroso, aqueles que arquitetaram a
queda do anterior, os florianistas José Freire Bezerril Fontenele, com posse em
27 de agosto de 1892, numa opulenta repressão aos deodoristas; e Nogueira Accioly,
que com habilidade, conseguiu a fusão do Centro Republicano com a União
Republicana, e daí a fundação do Partido Republicano Federalista, dando total
apoio a Floriano Peixoto. Iniciava o período do predomínio da oligarquia acioliana.
Fontes bibliográficas:
História do Brasil. Costa, Luís César Amaud. Ed. Scipione.
1999.
História & Vida Integrada 7. Piletti, Nelson; e Piletti,
Paulino. 2002
História do Ceará.
Souza, Simone (coordenadora). Fundação Demócrito Rocha, 1989.
História do Ceará. Aragão, Raimundo Batista. IOCE, 1982.