Tremembés (Nicolau de Resende) |
A história de Trairi,
no Ceará, associa-se às primeiras experiências da raça branca nas Américas.
Ponto estratégico do litoral brasileiro, serviu de base de apoio a muitos
navegadores europeus, na atração de matéria prima, como madeiras, pratas e
frutas, além de água doce, banhos nas lagoas, para prosseguimento de viagens,
ainda que para tal às custas de difíceis negociações com os índios primitivos,
os tremembés.
Nação Tremembé
De etnologia
desconhecida, para muitos estudiosos os tremembés não pertencem ao grupo dos tapuias
(que não falavam tupi), muito menos tupi,e assim classificamos os tremembés como Nação. De pele escura, teriam chegado à América oriundos da África, em rústicas
embarcações, saltando de ilha em ilha há mais de 110 mil anos. Por isso, foram
os primeiros nativos a contatar estrangeiros, custando-lhes muitas vidas. Divinos pescadores e
flecheiros, habitaram praticamente todo o litoral do Ceará (que na época incluía
o Piauí) e parte do Maranhão. Mas, na defesa contra a invasão branca, suas
terras foram cedidas a uma etnia que chegara do leste, mais segura e de diálogo
conciliatório.
Potiguaras
Os potiguaras viviam
entre os rios Paraíba e o Jaguaribe, célebres defensores do RN. Na época das
capitanias hereditárias, no século XVI, houve uma ofensiva portuguesa naquela
região que gerou a conquista das terras e consequente expulsão dos primitivos,
que resistiam em trabalhar nos engenhos. Muitos, aliás, anteciparam-se e
partiram para o Ceará, onde os tabajaras, da PB, aliaram-se aos franceses, que
pelas serras procuravam ouro e prata. Os potiguaras se entenderam com os
tremembés, fixando-se entre o Jaguaribe e o Mundaú, e em consequência o
surgimento de “troncos”, como os anacés e tapebas.
Do Mundaú ao Pecém,
ficaram conhecidos como “pitiguaras”, provavelmente devido à pronúncia dos
tremembés referindo-se aos potiguaras (potiguares ou “petegoares”), em seu
dialeto, e por sua vez chamavam o rio Trairi por “Corubu”. No século XVIII, aliás, os anacés moravam na beira do rio Mundaú, conforme registros em cartas de sesmarias.
Europeus
O Tratado de
Tordesilhas (1494), que deliberava a partilha de terras entre Espanha e
Portugal não foi bem recebido pelos vizinhos, célebres conquistadores, que desconsideraram o mesmo. Antes da
chega dos portugueses, outros europeus estiveram na costa cearense. No caso dos
holandeses, ou neerlandeses, flamengos, aos quais os lusitanos acusavam de
“pirataria", destacaram-se em várias atividades, registrando tudo, em todos os
sentidos, da escrita à pinturas. Os mapas da época traziam seus espantos com o
tamanho do território cearense, pois o apresentava maior que o atual.
Antigo mapa holandês põe em dúvida a localização do Forte de São Lourenço. Pode ter se localizado em praias trairienses. |
Missionários
Temos registros, de
1607, da passagem dos padres Francisco Pinto e Luiz Figueira por terras
trairienses (Barão de Studart, por exemplo, não cita a localidade, mas
relaciona a geografia) e da relação harmoniosa entre os religiosos e os “pitiguaras”,
entre os rios Curu e Mundaú. Padre Serafim Leite foi enfático ao mencionar
índios praianos como acompanhantes dos missionários até a Serra da Ibiapaba
naquele ano. Cobra Azul, que provavelmente vivia na foz do rio Trairi, primeiramente, liderou
essa marcha, porém, em seguida, chegou o líder Jacaúna. Por certo, fora
informado da excursão quando chegara de outras praias e seguira em disparada
rumo à serra. Isso prova que Jacaúna, ou Algodão, vulgo Amanaí, fizera parte, em 1603/04, da expedição de Pero Coelho e conhecia o líder tabajara, da Ibiapaba,
Jurupariaçu, o Diabo Grande.
Localização do Forte
Ao forte de São Lourenço, que Pero Coelho teria erguido na
foz do rio Jaguaribe, também citado como São Lucas, não é dada a confirmação da
legitimidade da sua localização, tendo em vista que em seu entorno viveria
Jacaúna e seus índios, que preferiram a catequese à ameaça de guerra contra os
portugueses. Sabe-se, porém, que o líder indígena vivia entre o Iguape e o
Mundaú. Mapas neerlandeses indicam várias situações, inclusive nas proximidades de Trairi.
Brilhantes Artesãos
Cerâmicas encontradas em escavações (Foto João Nilo Nobre) |
As catequeses
forçadas pelo branco mudaram a cultura indígena, porém a resistência nunca
cedeu. A tradição se mantem, ainda em meio à discriminação. Reflitamos as
palavras da estudiosa Maria Amélia Leite, da Missão Tremembé (Almofala, CE): “o
grande desafio é uma política indigenista de responsabilidade do Governo
Federal. É preciso que a sociedade entenda que os índios não se acabaram, que
aquele relatório de assembleia provincial, dizendo que não tinha mais índio em
aldeamento, foi usada de forma continuada por parte dos governos, de setores da
imprensa e da sociedade”.
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