quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Trairi - José Rôla e a Praça do Ferreira

 Os Primeiros Cinemas de Fortaleza


 
Av. 7 de Setembro, 12
(Cine Polytheama)
Os primeiros filmes exibidos em Fortaleza, na fase muda do cinema, eram de origem francesa (Paris) e italiana (Roma e Torino). Usava-se bar, teatro e piano, cantores, afinal era de bom gosto, sendo o seu objetivo comercial atrair a classe social mais abastada.

Em 26 de agosto de 1908, a cidade se espantou com a chegada do Cine Di Maio, ou "Cinematographo Art Nouveau", do italiano Vittorio di Maio, na antiga rua da Municipalidade, ou Intendência, hoje Guilherme Rocha. Vittorio, que era considerado o "Pai do Cinematographo no País", por ironia do destino acabou falecendo dentro do próprio no dia 21 de abril de 1926. Já em 1909, chegou o Cine Rio Branco, de Henrique Mesiano, na rua Barão do Rio Branco (antiga Rua Formosa) e o Cassino Cearense (Júlio Pinto).

  Dois grandes capitalistas, Luiz Severiano Ribeiro e Alfredo Salgado, compraram o Cine Di Maio, pois Vittorino falecera. Nascia o Cine Riche e o império das sétimas artes do cearense de Baturité, Severiano Ribeiro.



Polytheama, do Homem de Trairi


José Rôla 
Enfim, em 2 de julho de 1911, com "Pedra¨ (da Pathé-Frères) surgiu o quinto cine de Fortaleza, chegando à importante fase da história de uma família do meu Trairi.

O Cine-Teatro Polytheama foi o primeiro a instalar-se no meio do quarteirão nobre do Centro, ao lado da Praça do Ferreira, na rua Major Facundo, antiga Rua da Palma. Na verdade, na Av. 7 de Setembro, 12. Para muitos, o cinema número um. De propriedade da firma “Rôla, Irmão & Cia” (José e Chico, também ex-caixeiro), de imediato conquistou a preferência popular, com seus bons serviços, conforto e sofisticação.

 No Ceará, foi o primeiro a exibir filmes americanos, da famosa William Fox Corporation, assim como os suecos da Nordisk. Porém, numa ousada investida do concorrente, Luiz Severiano Ribeiro, foi fundado o magnífico e completo Cine Majestic, em 1917, ao seu lado, no prédio mais alto da cidade, onde também funcionou um hotel. Então veio a queda do Polytheama, que em 1922 passou para Luiz Severiano Ribeiro. E no local surgiu o magnífico Cine São Luiz.


A Luta do Empresário Popular


 O primeiro grande empreendedor do cinema cearense, José de Oliveira Rôla, o Zeca Rola, nasceu na Fazenda Retiro, em Trairi, no dia 12 de maio de 1867. Filho de Manoel de Oliveira Rôla, descendente de portugueses, que era o proprietário da Fazenda Taboca, na então Imperatriz (Itapipoca), próximo a São Bento (Amontada), quando menino e adolescente assistiu aos horrores das secas e pestes. Sua mãe, Dona Rita Xavier de Souza (Dindinha), sexta filha do coronel português Francisco Xavier de Souza, faleceu vítima de uma dessas moléstias. Com seus quatro irmãos, passou a infância em Trairi, estudando com o Professor José Joaquim Gouveia, que mais tarde tornara-se intendente interino (presidente da Câmara Municipal), ou seja, prefeito.


Ao lado do bonde, o Art-Nouveau, de José Rôla (Arquivo Nirez)



Ao chegar jovem na capital, empregou-se como caixeiro (auxiliar de tudo no comércio) na loja de louças de Joaquim Felício de Oliveira Lima, localizada também na rua Major Facundo. Pouco depois, em 1907, montou, em sociedade com o genro, Augusto Fiúza Pequeno, a sua primeira loja, Maison Art-Nouveau, bar-café-confeitaria requintado e autêntico, na esquina da rua Major Facundo com Guilherme Rocha (ou Rua da Palma com Municipal), prédio onde viria a funcionar, nos fundos, o Cine Di Maio, ou, para ser mais moderno, no Ed. Granito, onde tornou-se famosa a Tok Discos. Antes, ali, funcionava a Casa Almeida, a qual José Rola era sócio, e que em vista do Art-Nouveau, transferiu-se para adiante, Guilherme Rocha com Barão do Rio Branco. A Maison sobreviveu mais tempo que o maior concorrente, Riche (1926), mas acabou destruída por um incêndio por volta de 1930, quando encontrava-se arrendada.

 Confessou ao amigo Abelardo Montenegro ter sentido a morte do avô e da tia-avó materna, Semiramis de Oliveira Rola, e assim chamou o amigo e sua avó para morarem com ele. Dormiram no mesmo quarto, o mesmo se referindo ao trabalho no escritório, testemunhando a simplicidade e carinho do filho de Trairi.


Deu na Imprensa


 "O sr. José d'Oliveira Rôla, sócio gerente da "Maison Art Nouveau", veio à redação convidarmos a assistirmos amanhã, às 8 horas do dia, à inauguração dos novos e vastos salões do conhecido estabelecimento, agradecido". (Jornal do Ceará, 7 de dezembro de 1907)

 "Ante-ontem, domingo, teve lugar à inauguração da Maison-Art-Nouveau, presente grande número de pessoas, para cujo ato recebemos o convite do snr. José d'Oliveira Rôla, sócio gerente da mesma. Durante todo o dia, esteve repleta de visitantes, entre os quais cavalheiros e senhoras da melhor sociedade. Foi extraordinário o movimento da casa, que só se fechou às 12 horas da noite" (Jornal Unitário, 10 de dezembro de 1907)

 José Rola construiu no porto o "Pavilhão Atlântico", um abrigo para os viajantes, mas tinha a sua particularidade. Deslocava-se para lá e contactava os comandantes, conseguindo contratar suas orquestras para garantir a animação nas noites no seu salão, notadamente aos domingos. Colocava os músicos nos bondes e saía pela cidade divulgando as atrações. Chegou a ponto de promover as primeiras corridas de bicicletas, e obviamente gerando apostas financeiras, na Praça do Ferreira. E como amante do jogo, criou a Casa Americana, naquela praça, onde havia bilhares, jogo do bicho e até a atração maior, que era a imagem de um velho de óculos, "que decifrava sonhos e preia o futuro".

 José Rôla na Visão dos Historiadores



Família Rôla e Zeca
Conforme o pesquisador Edgar Alencar, José Rôla “era um homem de espírito, inteligente, inquieto, incansável, falante, com alma e tino de empresário, muito inclinado ao viver popular e estava sempre tomando iniciativas que agradavam o povo. Foi um grande animador da Praça do Ferreira, promovendo festas sociais e esportivas na Avenida Sete de Setembro (dentro da praça havia o logradouro com essa denominação, na qual se localizava). Foi o introdutor dos Brocoiós, caldo de cana naquela praça, além de leiloeiro acatado e respeitado. Sujeito a conjecturas que sempre afetaram o comércio na época, sofreu consequências, o que jamais contribuíram para que deixasse de ser uma figura popular e querida”.

 Para o sociólogo Abelardo F. Montenegro, "possuía espírito progressista e inovador, rompendo com a rotina dos lustres, iluminando seus estabelecimentos com luz elétrica". Bem antes do Estado, inaugurou uma rede particular de esgotos, aproveitando um trecho da Praça do Ferreira..."inaugurou mobiliário de cores, quebrando a monocromia do preto"..."terminou com o predomínio dos quiosques, abrindo casas confortáveis para freguesia "A esse homem que, a golpes de esforços e inteligência, ascendeu de caixeiro a patrão e a quem Fortaleza deve muitas inovações, ainda não foram prestada a merecida homenagem".

 "A esse incansável cearense muito de a cidade pelas suas constantes iniciativas, dotando-as de bares, tabacarias, garapeiras, cinemas e salas de bilhares". (Raimundo Girão).

 "Homem simples e alegre, tinha a verve espirituosa comum aos cearenses, identificando-se com todas as manifestações festivas do nosso povo". (Ari Bezerra Leite, estudioso em cinema)

 O nosso carinho à família Rôla, tradicional por seus serviços em Trairi, Itapipoca e Fortaleza. José Rola representa apenas um exemplo de devoção ao trabalho, amizade e solidariedade. Sempre ajudando o próximo, independente de classes sociais. Assim é esse povo. O povo de Nossa Senhora do Livramento.

Bibliografia:

“Fortaleza de Ontem e de Anteontem” -  Edgar Alencar.

"Fortaleza, a Era do Cinema" - Ari Bezerra Leite (fotos de José Rola & família, e da Praça do Ferreira)

"Geografia Estética de Fortaleza" - Raimundo Girão


O filme "Odette" (Dir. Giuseppe de Ligouro), com Francesca Bertini e Carlo Benetti, foi
exibido no Polytheama em 1 de agosto de 1916. (Fortaleza, a Era do Cinema)



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