terça-feira, 18 de outubro de 2016

Trairi - Mundaú 1965: O Sumiço de Pescadores

 "O Luto Incerto" - Jornal Correio do Ceará, 17/11/1965

 Texto: Helder Feitosa. Fotos: Vieira Queiroz


Esposas, as mais esperançosas 

Deu à praia de Mundaú, próximo de Itapipoca, uma jangada de madeira que se supõe ser a “Lambreta”, na qual Jerônimo e mais três companheiros usaram na fatídica viagem. A informação partiu de pessoas residentes em Fortaleza que estiveram naquele local em gozo de férias. Se verídico tal informe, então fora de cogitações as hipóteses de sobrevivência do legendário pescador e dos demais colegas. Afastam-se também as possibilidades da frágil embarcação ter sido abalroada por um navio.

 Mesmo assim, ainda se constitui intricado o mistério sobre o que vem ocorrendo nos últimos meses nas costas cearenses. Em menos de sessenta dias, sete jangadeiros foram tragados pelo mar, motivando uma onda de receio e deixando atônitos os homens que arrancam o ganha-pão no oceano.

Nada de Providências


 A situação torna-se mais grave quando se sabe que a menor providência não foi adotada para a elucidação dos fatos. Pais de famílias deixam os lares em busca de trabalho no mar, não retornam mais e o caso fica relegado numa incrível  indiferença. Sendo assim,  os parentes, impossibilitados de quaisquer recursos, atravessam momentos angustiosos e vivem um drama comovedor, sem saberem o que fazer, porque não existe um órgão governamental competente a quem possa dirigir-se.

 Pescador, Ofício Ingrato


 É, realmente, um ofício ingrato e de pescador. A água furiosa lhe atraiçoa e ninguém se interessa pelo seu infortúnio. Entrementes, o que estaria acontecendo nos mares cearenses? Eis a pergunta que paira no ar e cuja resposta tão cedo poderá advir. Nada menos que sete viúvas de jangadeiros atravessam com filhos e familiares um problema enigmático: estariam mortos os seus maridos ou eles permanecem vivos encalhados em alguma praia? Trata-se de outra indagação difícil de ser respondida. E quem poderia responder positivo ou negativo se nada oficial existe para um pronunciamento nesse sentido?

 Há poucos meses, um avião caiu bem próximo à Praia do Futuro (Fortaleza) e, até hoje, o paradeiro dos corpos do piloto e do geólogo que vinha a bordo estão envoltos de denso mistério. O desastre não se passou despercebido completamente em virtude da contribuição da Base Aérea e da nossa Marinha, que puseram em prática os deus sistemas de busca e salvamento, o que ocorreu agora mesmo com o caso de Jerônimo. Acontece, entretanto, que tais atitudes partiram de uma colaboração espontânea por parte daqueles órgãos, os quais não são imbuídos para TAM mister.

Viúvas?


 Para muitos é um fato consumado. Os sete jangadeiros estariam motos. Porém, para as viúvas, as esperanças não morreram e o dilema continua.  Para elas, os queridos partiram para pescar e estão chegando. Nenhuma autoridade lhes forneceu atestado de óbito. Por isso, como a mulher de Jerônimo, vão diariamente à praia e alimentam a ilusão de que seus maridos ainda vivem. Algumas delas vestiram luto, outras, no entanto, rejeita esse traje porque não sabem de nada. Somente o tempo é que se encarregará de esclarecer. Mas quem fornecerá os atestados de óbito às viúvas dos jangadeiros?

Esposa com a foto de Jerônimo. Teria sido devorado pelo mar o legendário dragão?




Um comentário:

  1. Beleza,Lucas Júnior. Esta triste realidade tem atravessado séculos com pescadores em nossas praias.

    ResponderExcluir